segunda-feira, 14 de junho de 2010

Ódio ao sucesso

É notório o desprezo, ou até mesmo ódio, que o brasileiro tem pelo conhecimento; os personagens do Lima Barreto nos lembram disso o tempo todo. José Guilherme Merquior, que lia muito, foi acusado de terrorismo bibliográfico em debate público por tentar rastrear uma idéia com mais de duas ou três referências. Eu diria que o brasileiro tem ódio ao sucesso alheio, mas por que teria ódio ao conhecimento se ele mesmo não considera isso uma forma de sucesso? Nesse caso acho que há mais birra que ódio; há a simples constatação de que outros têm o que não tenho. Ou, para não desacreditar de todo da raça humana, há a vaga intuição de que o conhecimento nos leva a um mundo mais interessante e, para eles, insondável.

Quando o assunto é dinheiro a coisa muda de figura. O dinheiro se transformou no parâmetro preferido de aferição do caráter humano: odeia-se quem não se comporta apropriadamente em relação a ele. Nós armamos esquemas sociais curiosos pra tentar fugir a essa conclusão. Exemplo: emprestamos dinheiro com prodigalidade, mas apenas para aqueles que sabemos serem bons pagadores. Ao mesmo tempo em que afetamos desprendimento em relação a bens materiais, fomentamos um ambiente de execração aos devedores. Pagam-se as dívidas não mais por sentimento de dever, mas por medo de retaliação. Prova disso é que, quando o credor se esquece da dívida, o devedor acompanha-o de bom grado na amnésia contábil.

Vejam o caso dos judeus. Até há poucos anos eu supunha ingenuamente que os anti-semitas praticamente inexistiam entre nós. Supunha também que os poucos que existissem justificariam o anti-semitismo com algo mais que o argumento da dominação fiduciária. A totalidade dos anti-semitas que conheço pessoalmente (não são muitos, mas a coincidência já me parece assombrosa) podem até ter motivos mais obscuros para serem anti-semitas, mas, ao tentar explicá-lo, só se lembraram de mencionar episódios de ordem pecuniária, alguns deles pateticamente anódinos. Ainda que não esteja aí o principal motivo, é com esse motivo que eles esperam conquistar nossa empatia.

De toda a complexidade da origem do anti-semitismo, pouca coisa parece ter sobrado, no Brasil, além do dinheirismo. Deve servir de consolo aos judeus a percepção de que por aqui todo sucesso financeiro é visto com desconfiança. Poderia haver preconceito mais contraproducente?

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