quinta-feira, 12 de novembro de 2009

O dilema da inteligência

O sujeito, quando dá conta de si no mundo, pode cair em uma de quatro categorias:

(a) Eu sou inteligente e o resto do mundo também. Essa parece ser a situação mais estimulante; há espaço para competições saudáveis e a vida é um cenário constantemente surpreendente. O simples canto do pássaro trai uma inteligência superior; tudo parece ser de uma complexidade ilimitada ainda que inteligível. Por outro lado, se o sujeito não se podar aqui e ali, começa a surgir uma arrogância panteísta, a idéia de que todas as mentes somadas formam o deus infalível do intelecto.

(b) Eu sou inteligente e o resto do mundo é meio burro. Situação típica nos jovens e nos loucos, e nos jovens loucos. Cada giro que o planeta dá sem minha supervisão parece um desperdício; por não se saber ao certo por que o mundo não pára para ouvir minhas instruções, crescem o senso de injustiça e o ressentimento. O ressentimento, por sua vez, pode fazer com que o louco fique perigoso ou que o jovem nunca cresça.

(c) Eu sou meio burro e o resto do mundo é inteligente. Imagino que aqui predomine um complexo de inferioridade destrutivo ou uma vassalagem resignada, a depender da índole do sujeito. Os mais fleumáticos não devem deixar de se maravilhar, e de se beneficiar, com os prodígios dos outros; os mais agitados vão se valer de meios alternativos como a violência.

(d) Eu sou meio burro e o resto do mundo também. Aqui a aridez intelectual desanima a todos; boas idéias são ceifadas desde a origem por pura incredulidade. O tédio predomina e as perspectivas de melhoras são ridicularizadas: não há salvação e é contraproducente pensar em semelhante fantasia.

Daqueles que ao menos param pra pensar no que vai acima, a maioria parece estar inserida na quarta categoria. Nós só não nos julgamos completamente burros (daí o 'meio') porque reconhecemos que há algo de errado. Ninguém nega que a inteligência existe, mas ela parece estar perdida no passado ou pulverizada no presente. O tipo de inteligência que indubitavelmente existe hoje, o tipo científico, perde o calor da novidade depois de pouco tempo -- a menos que o sujeito, geralmente um da primeira categoria, não consiga perceber seus limites. Os inteligentes de hoje estão enganados e os de ontem entediados.