segunda-feira, 13 de abril de 2009

A autoridade das idéias ad hoc

Na era da informação, o simples fato de termos uma idéia, somado à constatação de que não somos completos idiotas (no nosso próprio julgamento), já confere à idéia em questão um caráter oficioso, passível de publicação em manual didático num futuro próximo. Como não há quem queira entrar em disputa, por cordialidade ou ignorância mútua, as idéias ad hoc só se diferenciam pela inventividade e pelos malabarismos retóricos de seus autores. Dou um exemplo recente:

E voltando ao Velho Testamento: Moisés anunciar para um bando de retirantes que não deveriam olhar para a mulher do próximo faz bastante sentido quando se quer diminuir o número de crimes passionais em suas hordes.

As idéias ad hoc geralmente se apresentam como acima: algo tido como verdadeiro séculos afora é repentinamente desacreditado graças a um detalhe circunstancial que, curiosamente, todos os que vieram antes de nós, esses bobinhos, não conseguiram perceber. Também geralmente, o detalhe circunstancial é de ordem administrativa. "É muito conveniente que a lei da gravidade funcione, ou não poderíamos erguer prédios" serve como prova de que não poderia existir um universo sem lei da gravidade. Se pressionados, os autores das idéias ad hoc lembrarão que não estão a fornecer provas, apenas sugestões 'plausíveis', apesar de no íntimo de suas almas acreditarem piamente que acabaram de desferir um golpe mortal contra o edifício da tradição.

Adicionalmente, essas idéias propõem soluções bem mais simples, uma espécie de massificação da navalha de Occam. É como se dissessem: "joguem fora todos os seus livros de História, o que se julga conveniente hoje deve ter sido conveniente para todos os homens em todos os tempos". Se um dos mandamentos pode ser explicado circunstancialmente, por que não fazê-lo, ainda que ele seja válido independentemente das circunstâncias, inclusive quando elas se mostram adversas?

Dou outro exemplo, cuja fonte não consegui recuperar: o cristianismo tornou-se a religião oficial do império romano porque era muito 'conveniente' aos imperadores ter súditos que aceitavam dar a Deus o que é de Deus e a César o que é de César. Nunca antes vimos idéias tão ambiciosas, nem tão falsas.

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